terça-feira, 3 de agosto de 2010

Debatendo a China

O debate a seguir inicia-se a partir de um post de Almir em seu blog Limiar e Transformação:

Almir

Interessantes teus comentários mas é necessário tomar em consideração o seguinte:

1 - Não existe um “modelo” de desenvolvimento via salários baixos. A atração do capital internacional para China não se apóia só nem predominantemente neste fator. Em primeiro lugar está a qualidade da mão de obra (disciplinada e educada, ademais de “trabalhadora”). Não vale a peã ajudar a argumentação das burguesias do terceiro mundo de que sua competitividade se apóia na mão de obra barata. Sob este argumento muitos sindicalistas nacionalistas acusam o aumento de mão de obra como pro imperialista e contrário ao nosso desenvolvimento. O maior movimento de capital nos anos 70 a 2000 foi para a tríade capitalista de altos salários. O movimento de capital internacional não vai deixar de dirigir-se para a China devido a aumento de salários.

2 - É preciso ver que os salários chineses não podem ser medidos em dólares. A diferença cambial é gigantesca e pode-se viver com baixos salarios em dólares

Com um poder de compra muito superior. Não creia que o salário mínimo chinês é inferior ao brasileiro do ponto de vista de poder de consumo. O mesmo produto chinês que você compra aqui por 100 dólares vale menos de 10 dólares na China, por exemplo. Ademais disso nos últimos 30 anos a renda média dos chineses se elevou em mais de 200%. Não é correto demonizar o processo chinês, muito menos ainda se se trata de comparar com a fase anterior, particularmente com o período da revolução cultural.

3 – Não há uma rebelião operária em marcha na China. As greves a que você se refere são conduzidas pelo Partido Comunista Chinês que as noticia agora sem nenhuma condenação ou acusação porque ele mesmo as coordena. Ao mesmo tempo se desenvolve um sistema de previsão social no setor privado que não existia antes e se fala de expansão de um Estado de Bem estar no setor privado da economia pois no setor estatal não existe previdência social paga pelos trabalhadores, suas pensões e seus direitos de saúde e educação, habitação, etc. são assegurados universalmente e nâo dependem de contribuição direta ou um sistema de previdência social. Estas mudanças, junto com a transferência de recursos para as regiões mais pobres da China, fazem parte da política do P.C., anunciada em 2004, de um período de “humanização” da política econômica chinesa.

4 – A política de “humanização” se combina cada vez mais na fase atual com uma política macro econômica voltada para o mercado interno e com uma política financeira internacional de formação de fundos soberanos que coordenam um plano de expansão de compra de empresas e inversões do estado Chinês no plano internacional. Para garantir seu crescimento, a China necessita de matérias primas de todo o mundo que ela tem de produzir ela mesma para assegurar a sua direção comercial para o mercado chinês. Ao mesmo tempo a China desenvolve um gigantesco processo de inovação e de pesquisa e desenvolvimento que recomenda o controle direto das empresas líderes na produção e sobretudo nos serviços que ela não domina. Enfim, a questão de um pretenso “modelo” chinês não se resume, nem mesmo passa substancialmente por uma política de baixos salários. Se considerarmos além disto tudo que o capitalismo de Estado chinês comanda hoje empresas estatais de grande dimensão mundial (as maiores do mundo) vemos que a questão central que se coloca na China na fase atual passa pela democracia industrial, quer dizer, pelo aumento e em alguns casos até criação de um sistema de gestão dos trabalhadores sobre as empresa.

5 – Por dim, não se deve confundir a China com as economias dependentes latinoamericanas. A China esteve sob dominação colonial num período relativamente curto e as economia não se reestruturou totalmente em função do capital internacional como as nossas. Ademais a revolução nacional democrática iniciada pelo kuomitang levou a uma reforma agrária radical completada pela tomada do poder pelo Exército vermelho e o Partido Comunista. Não comparar portanto conosco que não conhecemos uma reforma agrária de qualquer tipo e por outros processos similares na américa Latina e na África. Não confundir a China que foi a líder da economia mundial até o século XVIII com outras economias dependentes e subdesenvolvidas. Deixe estes preconceitos eurocêntricos para os europeus e americanos do norte.





[Limiar e Transformação]

China hoje: superpotência econômica e inferno da classe operária


A China em dois tempos - as duas faces da China contemporânea: superpotência econômica e inferno da classe operária. Um país que se desenvolveu ao ponto de superar o Japão, e assumir o posto de 2o lugar no ranking global, mas que possui uma classe operária a beira da revolta devido a superexploração do trabalho. Sinais evidentes de mudanças em curso tanto no sistema mundial como internas, de maneira explosiva.

Revelando assim duas coisas: Primeiro, está em curso fortes transformações no sistema mundial, com implicações nos papéis políticos e econômicos do sistema. E desenvolvimento não é sinônimo de bem-estar social, e sim de transição entre uma etapa a outra na formação social, de transição de uma sociedade pré para uma industrializada, a custa evidentemente da exploração da classe trabalhadora nacional, que pode ou não se beneficiar do avanço das forças produtivas internas, com a consequente implantação das relações de produção capitalistas correspondentes, baseadas na oposição entre burguesia e proletariado, entre exploradores e explorados. E segundo, mostra que um país dependente pode, sem superar totalmente a dependência, se industrializar e desenvolver, assumindo um papel importante, e mesmo central, no sistema mundial capitalista, o que provavelmente está ocorrendo também com Rússia, Índia, Brasil e África do Sul, entre outros.

Para piorar, evidência outra coisa frequentemente negligenciadas na teoria econômica mesmo heterodoxa: o desenvolvimento econômico capitalista é totalmente compatível com a superexploração do trabalho, que no caso chinês, além de beneficiar sua elite local está compensando as perdas do grande capital da Tríade (EUA, UE e Japão, também chamado G3) com a crise econômica de 2008. Isso bem explica porque onde os conflitos e greves operárias na China mas ocorram, são justamente na fábricas de capital japonês, capital que muito sofreu com a crise, ao ponto de perder o segundo lugar no ranking das economias.

Outra questão interessante, a imprensa chinesa, fortemente censurada pela ditadura pró-burguesa do Partido Comunista e do Exército Popular, foi obrigada a noticiar as greves, sinal evidente que esses episódios foram de uma proporção enorme ou até maior do que noticiado, e que pode estar ocorrendo uma série muito maior de episódios semelhantes ou piores. Possivelmente estamos vendo o começo de mudanças internas importantes (a ditadura forçada a agir ou a ceder) ou o início de transformações sociais profundas, como o começo de um ascenso social do movimento operário, apesar do controle sobre os sindicatos.

A restauração capitalista da China iniciada no fim da década de 1970 e início da 1980 trouxe não apenas as multinacionais e a industrialização acelerada, mas a reconstrução das relações capitalistas, e com elas as contradições sociais, e uma exploração desmedida da classe operária, que além dos superlucros para elite local e para o capital internacional do G3 gerou uma superpotência econômica fundada
no capitalismo de Estado monopólico e transnacional (logicamente sob a base material e política anterior da socialização herdada do período comunista), mas também na superexploração do trabalho. Mas trouxe também uma classe operária nova sem as amarras típicas dos países centrais, como a aristocratização operária, sem direção socialdemocrata, e a cada crise mundial, por ter sua exploração ampliada, caminha à rebelião.

E a mesma industrialização capitalista, trouxe também, uma forte burguesia nacional de Estado, que embora dependente do grande capital internacional, é sedenta por espaço econômico no mercado mundial e por um papel político relevante no sistema mundial dos Estados, que tem um projeto nacional e uma direção política clara, tanto herdada da base anterior do período comunista como construída pela fase atual da ditadura.

Em suma, a China hoje, superpotência econômica e inferno dos seus operários, é um coquetel atômico instável, que como diria Rosa Luxemburgo (é claro, que ela se referia ao países capitalista como um todo, mas citando especificando a Alemanha do começo do século XX ), ou caminha para barbárie ou para a revolução. A História diria Marx, se repete como farsa ou como tragédia. É preciso os marxistas estarem atentos para interferir na História a favor do proletariado e do projeto socialista.


Leia as matérias a seguir:

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China supera Japão e é a segunda maior economia do mundo

País caminha para superar também os Estados Unidos e liderar o ranking global por volta de 2025

Reuters | 30/07/2010 07:42
A China tirou do Japão o posto de segunda maior economia do mundo, em resultado de três décadas de forte crescimento. Dependendo de quão rápido o câmbio suba, a China caminha para superar também os Estados Unidos e liderar o ranking global por volta de 2025, de acordo com projeções do Banco Mundial,
A China chegou perto de superar o Japão em 2009. "A China já é agora, de fato, a segunda maior economia do mundo", informou Yi Gang, chefe do órgão regulador de câmbio, nesta sexta-feira.

A China cresceu 11,1% no primeiro semestre de 2010 sobre igual período do ano passado. A expansão do país vem registrando uma média anual de mais de 9,5% desde que adotou reformas de mercado em 1978.

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China enfrenta a 'revolta' da mão de obra

Nos últimos três meses, a Honda enfrentou quatro ondas de greves na China, que terminaram em aumentos de salários para milhares de operários de suas fábricas e de seus fornecedores

AE | 25/07/2010 10:58


Nos últimos três meses, a Honda enfrentou quatro ondas de greves na China, que terminaram em aumentos de salários para milhares de operários de suas fábricas e de seus fornecedores.

A Foxconn, maior fabricante de produtos eletrônicos do mundo, anunciou em junho que elevaria em pelo menos um terço o pagamento de seu exército de 600 mil empregados chineses, depois que dez deles se suicidaram neste ano. E, no início deste mês, algumas regiões reajustaram em cerca de 20% o valor do salário mínimo, que não é unificado nacionalmente.
A sucessão de manchetes sobre conflitos laborais, o aumento da remuneração e a escassez de operários desencadearam um acirrado debate, no qual economistas se dividem entre os que acreditam no fim da era da mão de obra barata e abundante e os que sustentam que ainda há um longo caminho a ser percorrido até que a China perca a vantagem comparativa dada por milhões de empregados mal pagos.

Greves e protestos de operários não são um fenômeno raro no país, diz a economista brasileira Paula Nabuco, da Universidade Federal Fluminense, que elabora tese de doutorado sobre economia e relações de trabalho na China. A novidade agora é que as paralisações ganharam destaque na imprensa oficial, totalmente sujeita à censura do governo, e atingiram as grandes companhias multinacionais instaladas na China, especialmente japonesas.

A montadora Honda foi alvo da mais longa greve registrada em empresas estrangeiras no país, que interrompeu por três semanas sua linha de montagem em Foshan, na província sulista de Guangdong, a maior base exportadora chinesa. A paralisação terminou no início de junho, depois que os operários conquistaram reajuste salarial de 24%.

A mais recente onda de greves enfrentada pela companhia japonesa chegou ao fim na quinta-feira na Atsumitec, que produz peças para os freios do Honda Accord. Os operários conquistaram aumento de 45%, o que elevou sua remuneração a 1.420 yuans mensais. Mesmo com o reajuste, os 1.420 yuans equivalem a R$ 370,00, pouco mais de dois terços do valor do salário mínimo brasileiro, de R$ 510,00.

Stephen Roach, presidente do banco Morgan Stanley na Ásia, afirmou em artigo publicado no portal da revista The Economist que é "totalmente prematuro" sustentar que chegou ao fim a vantagem comparativa dos custos trabalhistas na China.

O executivo observou que os operários chineses ganhavam US$ 0,81 por hora em 2006, o que correspondia a 2,7% do que trabalhadores norte-americanos recebiam. Mesmo se tivessem obtido reajustes anuais de 25% no período de 2007-2010 - hipótese descartada por ele -, a remuneração no país asiático seria hoje de US$ 1,98 a hora, ou 4% do que é pago nos Estados Unidos e metade do valor registrado no México. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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Postado por Almir Cezar Filho no Limiar e Transformação em 7/30/2010

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