segunda-feira, 2 de abril de 2012

Israel x Irã: O espraiamento do conflito (2ª parte)

Israel x Irã: O espraiamento do conflito (2ª parte)

Publicado pela agência Carta Maior



Uma guerra entre os dois países, além de massacrar, possivelmente, milhares de árabes e israelenses, bem como norteamericanos, elevaria o preço do gás e do petróleo a um nível inimaginável, catapultado para uma cifra superior a US$ 250, ou mesmo chegar US$ 500 o barril, interrompendo o comércio e causando um cataclismo na economia mundial, já abalada e deprimida, desde 2007-2008, pela crise do sistema financeiro, a partir do colapso do Lehman Brothers e outras corporações. O artigo é de Luiz Alberto Moniz Bandeira.

Luiz Alberto Moniz Bandeira

Devido à sua relevância geopolítica e geoestratégica, interligando o subcontinente indiano ao Mar Mediterrâneo, seria virtualmente inevitável o spillover da guerra contra o Irã, deflagrada por Israel com ou sem a participação dos Estados Unidos, devido às suas implicações religiosas e sectárias. Embora o número de xiitas, entre os muçulmanos, represente de 10% a 11%, contra mais ou menos 90% de sunitas, eles constituem a maioria da população do Irã, Azerbaijão, Iraque, Bahrain, minorias qualitativamente importantes em praticamente todos países do Oriente Médio e adjacências. Estão concentrados em áreas estrategicamente importantes para o Irã [1].

Na Arábia Saudita, em uma população de 19,4 milhões, os xiitas, cerca de 1,5 milhão a 2 milhões de habitantes, representam cerca 10%, mas estão concentrados em al-Qatif e al-Awamiyah, na Província Oriental, a mais rica em petróleo, onde representam 1/3 dos moradores e vivem institucionalmente discriminados, nas piores condições econômicas, proibidos de construir suas mesquitas etc [2]. As tensões são antigas. Desde 2011, a população xiita começou a protestar, com mais intensidade, e a insurgir-se, mas as manifestações pacíficas foram reprimidas brutalmente pelas tropas do rei Abdullah. Tanto nas manifestações de 24 de novembro de 2011 quanto em 24 de janeiro de 2012, diversos civis, que protestavam, pacificamente, foram mortos e milhares, presos [3]. E a mídia internacional nenhuma relevância deu a esses fatos.

Entretanto, os xiitas, concentrados em al-Qatif e al-Awamiyah, na Província Oriental, configuram um punhal apontado para o coração petrolífero do país, de onde os Estados Unidos importam cerca de 12% dos 19 milhões de barris que consumiam, a cada 24 horas, em 2011 [4]. Nos primeiros meses de 2012, diversas manifestações de protestos contra a monarquia wahhabista e os Estados Unidos ocorreram ao longo dos portos da Arábia Saudista, envolvendo Qatif (al-Qatif), Rabiyia (al-Rabeeya) e Awamiyah (al-Awamia), porto este por onde fluem mais de 2 milhões de barris de petróleo todos os dias [5].

No caso de guerra contra o Irã, os xiitas certamente voltariam a rebelar-se e atacar os campos petrolíferos lá existentes, assim como as instalações dos Estados Unidos e das companhias norteamericanas, como aconteceu em 25 de junho de 1956, quando um atentado terrorista explodiu as Khobar Towers, perto da companhia Saudi Aramco, na cidade de Dhahran, matando 19 soldados e civis americanos. A estabilidade e a integridade geográfica da Arábia Saudita estariam ameaçadas, inclusive pela secessão da Província Oriental, região de fundamental importância, não apenas econômica, mas também geopolítica e estratégica, pois está situada à margem do Golfo Pérsico e sua capital, Dammam, ligada a Bahrain pela ponte de Manama.

Os xiitas compõem cerca de 70% da população de Bahrain, estimada (2011) em 1.214.705 habitantes (cerca de 517.368 são trabalhadores estrangeiros) e poderiam, provavelmente, aproveitar as circunstâncias para também se rebelar contra o regime do emir sunita, auto-proclamado rei 2002, Hamad bin Isa al Khalifa, como o fizeram em 2011 e foram sangrentamente reprimidos pelas tropas da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos, que atravessaram a ponte de Manama sob a égide do Gulf Cooperation Council (GCC), a fim de sufocar as manifestações e proteger as “instalações estratégicas” lá existentes. A população xiita vive econômica e politicamente marginalizada. E suas manifestações, exigindo reformas democráticas, sob a liderança do clérigo Sheik Isa Qassim, não cessaram, reproduziram-se em março de 2012, assustando a elite sunita e a monarquia Wahhabi da Arábia Saudita.

Bahrain é um pequeno país insular, de 692 km², um arquipélago de trinta e cinco ilhas e ilhotas, no Golfo Pérsico, mas, embora sua produção atual de petróleo seja diminuta, da ordem aproximada de 239,900 bbl/d (2009 est.), tem fundamental importância geopolítica e estratégica para a Arábia Saudita e, principalmente, para os Estados Unidos. A 5ª Frota está estacionada na base naval de Manama, com 40 navios e 30.000 efetivos, e o aeroporto de Muharaq e a base aérea Sheik Isa são usados pela Força Aérea americana para as operações no Golgo Pérsico, no Mar Vermelho, no Mar Árabe e no Estreito de Hormuz. A presença militar dos Estados Unidos legitima a autocracia sunita da família al Khalifa. E se a maioria xiita assumir ou assumisse o poder em Bahrain certamente contaria com o respaldo da população da Província Oriental, que também se insurgiria na Arábia Saudita e certamente teria o suporte do Iraque e do Irã.

A guerra sectária espraiar-se-ia, também, ao Líbano, à Jordânia, recrudesceria no Iraque e na Síria, bem como na Líbia e no Iêmen, e poderia atingiria Qatar, onde os Estados Unidos construíram instalações do US Central Command (USCENTCOM) e US Army Forces Central Command (ARCENT), em Sayliyah, aquartelando duas brigadas e mais de 11.000 soldados. Na Base Aérea de Al Udeid, localizada a oeste de Doha, estão instalados o United States Central Command (USCC) e United State Air Force Central Command (USAFCC), bem como hospedada a 379th Air Expeditionary Wing da USAF e No. 83 Expeditionary Air Group RAF. De um modo ou de outro, a guerra sectária afetaria e envolveria as tropas dos Estados Unidos, dado que há décadas apóiam Israel e os regimes ditatoriais da região, inclusive a monarquia Wahhabi, absolutista e corrupta, da Arábia Saudita, e o resultado seria o incremento do anti-americanismo e o maior fortalecimento de al-Qa’ida.

O desastre econômico
Cerca de 64% das reservas mundiais de petróleo (o Irã é o quarto maior exportador) estão situadas no Oriente Médio, que supre 70% das necessidades mundiais de petróleo, e a rota do Golfo Pérsico, atravessando o Estreito de Hormuz, até o Golfo de Oman é vital para o economia mundial, uma vez que por aí passam 40% do transporte marítimo global de petróleo e a guerra inevitavelmente interromperia o fluxo de 15 Mb/d do cru para a Europa e os Estados Unidos, bem para como a China, Japão e Coréia do Sul, entre outros países. O Estreito de Hormuz seria diretamente afetado e, em conseqüência, o transporte de óleo, ainda que o Irã não o bloqueasse militarmente.

Desde o início de 2012, o preço do petróleo tipo Brent aumentou em cerca de 10% e chegou a US$ 125,98, em março, devido à instabilidade no Oriente Médio. O Irã exporta 2,5 milhões de barris de petróleo por dia, e a Opep não tem possibilidade de compensar esse volume, no caso de um ataque de Israel ao Irã. E a guerra entre os dois países, além de massacrar, possivelmente, milhares de árabes e israelenses, bem como norteamericanos, elevaria o preço do gás e do petróleo a um nível inimaginável, catapultado para uma cifra superior a US$ 250, ou mesmo chegar US$ 500 o barril, interrompendo o comércio e causando um cataclismo na economia mundial, já abalada e deprimida, desde 2007-2008, pela crise do sistema financeiro, a partir do colapso do Lehman Brothers e outras corporações, e não superada nem nos Estados Unidos nem na Europa, até 2012. Os voláteis mercados financeiros entrariam em completo pânico, com outro golpe, muito mais profundo, que atrasaria ainda mais a recuperação do crescimento econômico dos Estados Unidos e, sobretudo, da União Européia.

O ex-presidente George W. Bush, em 2003, solicitou US$ 87 bilhões para a reconstrução do Iraque e do Afeganistão. Entretanto, desde então, os Estados Unidos estão a gastar cerca de US$ 2 trilhões por ano, nas duas guerras, e menos de 5% do total foi usado para a reconstrução [6]. Só em 2011, a campanha na Líbia custou para cada contribuinte norteamericano cerca de US$ 2 milhões por dia [7]. E, ao fim do ano, os Estados Unidos haviam gastado em torno de US$ 1 bilhão, fornecendo à OTAN mísseis, aviões de monitoramento, drones e toda sorte de munição para derrubar o regime de Muammar Kaddafi e levar o país ao caos [8].

Uma conflagração, abrangendo todo o Oriente Médio, envolveria necessariamente os Estados Unidos, cuja dívida pública, em 11 de março de 2012, havia alcançado um montante de mais de US$ 15,5 trilhões, maior que o PIB, estimado em US$ 15,04 trilhões (2011) [9], e continuava a crescer cerca de US$ 4,01 bilhão por dia [10]. E seus gastos na região, que já somam trilhões de dólares, cresceriam de maneira insuportavelmente esmagadora.

Em 2002, o presidente George W. Bush (2001-2005 e 2005-2009) acusou o Irã de constituir com o Iraque e a Coréia do Norte o “eixo do mal”. E ordenou que o U.S. Strategic Command, apoiado pela Força Aérea, elaborasse planos para bombardear o Irã. Porém, dentro do Pentágono, generais e almirantes advertiram que o bombardeio do Irã provavelmente não destruiria todas as suas instalações nucleares e poderia produzir sérias conseqüências econômicas, políticas e militares para os Estados Unidos [11]. A comunidade de inteligência não havia encontrado evidência específica de atividades clandestinas ou de instalações ocultas e que os planos de guerra não eram seguros de acertá-las. E o presidente George W. Bush recuou, mas atacou o Iraque e o general Collin Powell, então secretário de Estado, até compareceu à reunião do Conselho de Segurança da ONU, em 6 de fevereiro e em 7 de março de 2003, para provar que Saddam Hussein possuía armas químicas e nucleares e era necessário urgentemente atacá-lo e derrubar seu regime. O presidente George W. Bush e o general Collin Powel mentiram. O Iraque não possuía nenhuma arma nuclear nem química.

Um oficial de alta patente do Pentágono comentou com o notável jornalista americano Seymour M. Hersh que a experiência no Iraque fora profundamente falha (deeply flawed) e havia afetado a avaliação do Irã. E acrescentou que “we built this big monster with Iraq, and there was nothing there. This is son of Iraq” [12]. Os Estados Unidos perderam a credibilidade e, nove anos depois de atacar e invadir o Iraque, onde perderam cerca de 4.486 soldados, tiveram 33.184 seriamente feridos e mataram entre 106.000 e 115.00 iraquianos [13], o presidente Barack Obama teve de retirar suas tropas, até 31 de dezembro de 2011, deixando quase todo o país arruinado, 470.000 pessoas vivendo em 382 acampamentos, em áreas inseguras, às quais faltam empregos e serviços básicos, conforme os dados da United Nations High Commissioner for Refugees (UNHCR) [14]. E ainda cerca de um milhão de iraquianos estão deslocados, por diversas regiões, e milhares vivem em condições miseráveis, incapazes de voltar às suas áreas de origem por causa da insegurança da situação ou da destruição de seus lares e falta de serviços básicos [15].

A situação no Afeganistão, de onde os Estados Unidos e seus aliados da OTAN estavam a planejar a retirada as tropas até o fim de 2014, não é muito diferente. Em março de 2012, o país continuava inseguro, em meio à uma situação econômica e politicamente instável, com um governo corrupto e incompetente, com graves problemas sociais - 1/3 da população desnutrida, menos de 1/4 com água limpa, desemprego- e 2,7 milhões de afegãos refugiados na região e cerca de 3 milhões no resto do mundo [16]. As forças dos Estados Unidos/OTAN haviam destruído casas, culturas e infra-estruturas e prosseguia o deslocamento de pessoas, cerca de 350.000, dentro do Afeganistão.

Em 16 de outubro de 2011, o ministro da Agricultura, Mohammad Asif Rahimi, revelou que mais de 30% da população afegã vivia abaixo da linha de pobreza e que era necessário investir na agricultura cerca de US% 1 bilhão por ano para evitar a crise de fome [17]. Dez anos de ocupação pelas tropas dos Estados Undos/OTAN fizeram do Afeganistão um dos países mais pobres, instáveis e inseguros do mundo [18].

Conforme o relatório “Costs of War”, preparado por acadêmicos, participantes do Eisenhower Research Project do Watson Institute for International Studies, da Brown University, as guerras no Afeganistão, Iraque e Paquistão, em dez anos, mataram 225.000 pessoas, incluindo homens e mulheres militares, mercenários das empresas privadas militares e civis. Só no Afeganistão foram mortos 137.000 civis, e mais 35.600 civis mortos no Paquistão. Até agosto de 2011 haviam morrido 5.998 soldados americanos, 43.184 foram declarados oficialmente feridos, no Afeganistão e no Iraque, e 54.592 requereram sair do teatro das Operations Enduring Freedom, Iraqi Freedom, New Dawn, por motivos médicos. E os custos financeiros situavam-se entre US$ 3.2 e US$ 4 trilhões, incluindo assistência médica e auxílio aos que estão ou estarão mutilados. Há muitos outros custos que não puderam ser quantificados, mas as guerras contra o terror, empreendidas pelos Estados Unidos, foram quase totalmente financiadas por empréstimos, juros de US$ 185 bilhões já pagos ou a pagar, e outro US$ 1 trilhão pode aumentar através de 2020 [19]. Isto significa que de 3% a 4% do custo anual das duas guerras, no valor total de US$1.27 trilhão, foi financiado com cartão de crédito, segundo Joseph Lazzaro [20].

Com duas guerras perdidas, no Iraque e no Afeganistão, do qual ainda busca uma retirada mais ou menos honrosas para as suas tropas, o presidente Barack Obama parece consciente do problema tanto econômico quanto militar. E não quer fazer uma aventura, especialmente em um ano eleitoral, embora não se possa desconsiderar o grau de “instabilidade e imaturidade” da opinião pública, nos Estados Unidos, i.e., do “seu potencial de histeria” conforme observou, há alguns anos passados, o inesquecível cientista político americano Brady Tyson [21]. A comunidade de inteligência dos Estados Unidos não está convencida de que o Irã pretenda realmente construir armas nucleares e a National Intelligence Estimate (NIE) de 2011 confirmou as conclusões de 2007 e 2010, segundo as quais o programa o programa foi paralisado desde 2003 [22]. Contudo, não descartou a possibilidade de que seja capaz de produzir bastante urânio enriquecido (HEU), que tanto serve para uso civil (geração de energia nuclear), quanto para uso militar (produção de armas atômicas).

O general James R. Clapper Jr., diretor da National Intelligence dos Estados Unidos, declarou que os especialistas americanos crêem que o Irã está a preservar a opção de produzir armamento nuclear, contudo não havia nenhuma evidência de que tomara essa decisão ou estivesse disposto a levar adiante esse propósito. O general David H. Petraeus, diretor da CIA, bem como o secretário de Defesa, Leon E. Panetta, e o general Martin E. Dempsey, chefe do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas, fizeram a mesma avaliação em suas entrevistas na televisão [23]. E o Ayatollah Ali Khamenei, líder dos (principistas), que venceram as eleições para o Parlamento (Majlis Shora Eslami) de março de 2012, e Supremo Guardião de suas leis religiosas (Velayat-e Faqih), reiterou que o Irã não estava em busca de armas “nucleares” e estocá-las é algo “inútil e perigoso” [24].

As contradições em Israel
Mais da metade da população de Israel é contrária a atacar o Irã, segundo pesquisa divulgada pelo diário israelense Ha'aretz, e acha que, se fosse necessário, não deveria fazê-lo sozinho [25]. Mas o governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, do Likud, está estreitamente aliado ao partido Ysrael Beitenu, sob a liderança de Avigdor Liebermen, ministro dos Assuntos Estrangeiros, de ultra-direita, que passou a influenciar grande parte da população de Israel. De 1989, com a desintegração do Bloco Socialista, até 2011, cerca de 1 milhão de russos de origem judaica haviam emigrado para Israel, passando a constituir 1/6 da população judaica (cerca de 6 milhões), a maioria dos quais de direita, ainda com a mentalidade da guerra fria.

Por outro lado, os ultra-ordotoxos sionistas, fundamentalistas, predominam entre os 350.000 a 400.000 colonos que expandem seus assentamentos na bíblica Judéia e Samaria, i.e., na Banda Ocidental ou Cisjordânia, os territórios ocupados por Israel na guerra de 1967. Eles almejam retomar toda a Palestina ou Canaã, a Terra Prometida, a Terra de Israel (Eretz Yisrael), e influenciam cada vez mais a IDF. Contudo, conquanto ainda existam 256 Kibbutzim (16 religiosos), com cerca de 106.000 habitantes e localizados em áreas periféricas, como Arava, o sonho de Israel como sociedade igualitária já se desvaneceu.

O Adva - 2009-10 Annual Social Report demonstrou que quase 40% dos israelenses “find it difficult or very difficult to live on their current income.” [26] O diário Ha’aretz calculou que os 500 israelenses mais ricos possuem um montante US$ 75 bilhões, num país cujo PIB é de apenas US$ 205 bilhões enquanto as 20 famílias mais ricas controlam quase a metade do mercado de ações [27]. E a fortuna conjunta desses mais ricos é 25% maior do que o orçamento de Israel em 2011 [28]. São eles o principal suporte do governo da coalizão dos partidos Likud-Ysrael Beitenu, de extrema direita. E as massivas demonstrações de protesto, que culminaram, em setembro de 2011, com a marcha de 430.000 pessoas (a maior na história de Israel), em Tel Aviv, evidenciaram que as principais contradições no país não são apenas étnicas ou religiosas, mas também sociais.

Mais de 60 anos após sua constituição, Israel apresenta enorme nível de desigualdade, com uma economia inteiramente dependente dos Estados Unidos, dos quais recebem, desde 1985, US$ 3 bilhões por ano [29], a maior parte como ajuda militar, embora não cubra todas as despesas do orçamento militar, avaliado no mínimo em US$ 13 bilhões ou, aproximadamente, 7-8% do PIB, um dos mais altos do mundo [30]. O custo dos Estados Unidos, com a instabilidade no Oriente Médio, cujo epicentro é o conflito Israel-Palestina, alcançou um total de quase US$ 3 trilhões, em dólares de 2002, maior do que o custo com a guerra no Vietnã [31].

Tudo indica que a retórica de Benjamin Netanyahu, ávido por atacar o Irã, seja para pressionar o presidente Barack Obama a conceder armamentos ainda mais sofisticados e avançados a Israel, ao competir com os extremistas do Partido Republicano. O presidente George W. Bush, durante sua administração, recusou-se a vender-lhe bombas de penetração profunda (bunker-penetrating bombs) e aviões de reabastecimento, em conseqüência das estimativas de que Israel pudesse usá-los para atacar as instalações nucleares do Irã [32].

Entretanto, o Prêmio Nobel da Paz, presidente Barack Obama, atendeu às solicitações do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e autorizou o secretário de Defesa, Leon Panetta, a negociar com o ministro de Defesa de Israel, Ehud Barak, a venda de aviões de reabastecimento e de bombas de penetração profunda (GBU-28 bunker-piercing) [33]. O Ma’ariv Israeli News Service informou que o fornecimento de tais armas a Israel visou a um acordo com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu no sentido de que ele retardasse o ataque ao Irã até 2013 [34]. Contudo, fontes políticas de Israel informam que a maioria do gabinete é a favor de um ataque militar ao Irã, mesmo sem a aprovação dos Estados Unidos e o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, no Knesset (Parlamento), fez um discurso bem explícito e resoluto, declarando que não hesitaria em tomar qualquer iniciativa, mesmo sem o acordo do presidente Barack Obama, e citou como precedente o primeiro-ministro Menahem Begin (1977–1983), que mandou bombardear o reator do Iraque, contra a orientação de Washington e a opinião de Yitzhak Hofi, do Mossad, e Yehoshua Saguy, chefe da inteligência da IDF [35]. E, preparando a opinião pública para a guerra, acusou o Irã como a “força dominante”, por trás dos ataques de Gaza, declarando que os “grupos de terror” estão sob o seu guarda-chuva e que os israelenses poderiam imaginar o que aconteceria se estivessem armados com bombas nucleares.

Conforme percebeu Aluf Benn, editor-chefe do diário israelense Ha’aretz, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, desde que retornou da visita a Washington, no início de março de 2012, empenhou-se, com um warmonger, em preparar a opinião pública para a guerra contra o Irã, tentando convencê-la de que a ameaça a Israel é tangível e existencial e deve ser suprimida para evitar um "second Holocaust" [36]. Não é crível que o Irã viesse a atacar Israel com ogivas atômicas, se as produzisse. Um ataque dessa natureza massacraria também a população palestina, dentro e fora de Israel, e grande parte da população do Líbano. O “second Holocaust” a que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu demagogicamente se referiu não seria somente de judeus, mas igualmente de árabes, cristãos, muçulmanos (inclusive xiitas), na Palestina e adjacências, bem como de parte da população do Irã, uma vez que Israel retaliaria da mesma forma.

Entretanto, embora para conter as pressões do lobby judaico nos Estados Unidos e dos candidatos extremistas do Partido Republicano, continuasse a afirmar que todas as opções estão sobre a meses, inclusive o “componente militar”, para impedir que o Irã adquira armas nucleares, o presidente Barack Obama deseja evitar um confronto armado e insiste na solução do impasse por meios diplomáticos, em meio ao endurecimento de sanções e operações encobertas de sabotagem e assassinatos [37], a guerra nas sombras. Não há alternativa, porquanto, em caso de um ataque aéreo ao Irã, o cenário será o do Apocalipse, quando o quarto Anjo tocou a trombeta e foram soltos os quatros Anjos, que estavam acorrentados à beira do Eufrates e se conservavam para a hora, o dia, o mês e o ano da matança da terça parte dos homens; eram 200 milhões de soldados e os cavalos, que montavam, encouraçados com uma chama sulfurosa azul, tinham crina como juba de leão, de suas narinas saíam fogo, enxofre e fumaça e uma terça parte dos homens foi morta por esses três flagelos, que lhes saíam das narinas.[38]

(*) Luiz Alberto Moniz Bandeira é cientista político e historiador, professor titular de história da política exterior do Brasil (aposentado) da Universidade de Brasília e autor de mais de 20 obras, entre as quais Formação do Império Americano (Da guerra contra a Espanha à guerra no Iraque).

NOTAS

[1] Bradley, John R. After the Arab Spring – How Islamists Hijacked the Middle East Revolts. Nova York: Palgrave –Mcmillan, 2012, pp. 95-97.

[2] Scott Malcomson. “Bahrain: The Widening Gulf”. The New York Times, March 16, 2011


[4] Alexander Cockburn. “Trouble in the Kingdom”. CounterPunch Diary - Weekend Edition October 7-9, 2011 . http://www.counterpunch.org/2011/10/07/trouble-in-the-kingdom/


[6] Frum, Darvid & Perle, Richard. An End to Evil. How To Win The War On Terror. Nova York: Ballantine Books, 2004, pp. 122-123.

Richard foi assistente do secretário de Defesa, Donald Rumsfend, durante o governo do presidente George W. Bush.

[7] “Allies meet in Abu Dhabi to discuss post Gaddafi future” Dayly Mail, 9 June 2011 - http://www.dailymail.co.uk/news/article-2001778/Libya-war-costs-US-taxpayers-2m-day-Gaddafi.html

[8] John Barry. “America’s Secret Libya War”. The Daily Best. Aug 30, 2011.


[10] U.S. National Debt Clock - The Outstanding Public Debt as of 11 Mar 2012 at 05:59:13 PM GMT - http://www.brillig.com/debt_clock/

[11] Seymour M. Hersh. “The military’s problem with the President’s Iran policy”, The New Yorker. July 10, 2006.

[12] Ibid.

[13] Iraq Body Count. http://www.iraqbodycount.org/

[14] 2012 UNHCR country operations profile – Iraq - http://www.unhcr.org/pages/49e486426.html

[15] Ibid.

[16] 2012 UNHCR country operations profile – Afghanistan - http://www.unhcr.org/cgi-bin/texis/vtx/page?page=49e486eb6

[17] GHANIZADA. “Above 30% of Afghan population facing poverty: Officials” KHAAMA PRESS | Afghan Online Newspaper. - Sun Oct 16, 10:57 pm

[18] “Afghanistan’s Most Vulnerable | The Poverty of War”. Afghanistan 101, Friday, February 24, 2012. http://afghanistan101.blogspot.com/2012/02/afghanistans-most-vulnerable-poverty-of.html

[19] ‘Costs of War’ Project - Estimated cost of post-9/11 wars: 225,000 lives, up to $4 trillion. Brown University - June 29, 2011 http://news.brown.edu/pressreleases/2011/06/warcosts

[20] Joseph Lazzaro. “Afghanistan War: The Cost of War”. International Businesses Times, Nov. 3 2011. http://www.ibtimes.com/articles/243110/20111103/cost-war-afghanistan-iraq.htm

[21] Brady Tyson. "O sistema Interamericano depois de São Domingos" in Poltica Externa Independente, Rio de Janeiro, Editora Civilização Brasileira, Ano I, nº 3, Janeiro 1966, pp. 83-108

[22] Josh Rogin. “Exclusive: New National Intelligence Estimate on Iran complete. Foreign Policy, Tuesday, February 15, 2011”.

[23] James Risen & Mark Mazzetti. “U.S. Agencies See No Move by Iran to Build a Bomb”. The New York Times. February 24, 2012.

[24] M K Bhadrakumar, “Obama gets Iran right, finally”. Asia Times, Mar 6, 2012.

[25] Ha’aretz poll: Most of the public opposes an Israeli strike on Iran“Support for Netanyahu's Likud party is at all-time high, but Israelis still skeptical regarding attack on Iran's nuclear facilities without U.S. backing.” Ha’aretz, 08.03.12

[26] Clement Daly. “Workers deserve one-state solution” The Eastern Echo October 5, 2011

[27] Nathan Lipson & Rony Gabay – “And the rich grew richer”
Ha’aretz, 07.06.11.

[28] Ibid.

[29] Jeremy M. Sharp (Specialist in Middle Eastern Affairs). U.S. Foreig Aid to Israel. Congressional Research Center, September 16, 2010.

[30] Ibid.

[31] Thomas R. Stauffer, Ph.D. The Costs to American Taxpayers of the Israeli-Palestinian Conflict: $3 Trillion. The Council for National Interest. Sunday, 31 July 2011 15:14

[32] Barak Ravid – “Netanyahu asked Panetta to approve sale of bunker-busting bombs, U.S. official says”. Ha’aretz, March 07, 2012.

[33] Ibid.

[34] Michael Kelley. “US Offers Israel Advanced Weapons In Exchange For Not Attacking Iran”. Business Insider – Military & Defense. March 08, 2012. AFP – “US 'offered Israel new arms to delay Iran attack'.” 08.03.2012 http://news.yahoo.com/us-offered-israel-arms-delay-iran-attack-005157280.html

[35] Ben Caspit. “Assessment: Security Cabinet Majority Is Pro Attack”. Ma’ariv, , 15 March 2012. Dan Margalit. “ The Prime Minister’S Verbal Poker Is Beginning To Be Successful”. Israel Hayom, 15 March 2012.

[36] Aluf Benn. “Netanyahu is preparing Israeli public opinion for a war on Iran” . Ha’aretz, 15.03.12

[37] Cerca de cinco cientistas nucleares iraniano foram assassinados desde 2007, ou pela CIA ou pelo Massad, que financia os terroristas sunitas da Majahidin-e Khalq Organization (MOC ou MeK), adversários do regime xiita no Irã.

[38] Offenbarung des Johannes (Apokalipse), 9 Kapitel . Das Neuen Testament, pp. 330-331, in Die Heilige Schrift des Alten und Neuen Testament. –Aschaffenburg: Paul Pattloch Verlag, 1965.

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