Ciências Sociais
AS DIMENSÕES DA SITUAÇÃO HUMANA
Theotônio Júnior
(Ano 1 - Número 6 - Belo Horizonte - 11 de Maio de 1958)
Theotônio Júnior
(Ano 1 - Número 6 - Belo Horizonte - 11 de Maio de 1958)
1 - A primeira tarefa para a clareza do que devo expor é procurar compreender o sentido da situação humana. Para isso devo tentar somente uma caracteriologia desta, sem procurar pensar até o fim esta compreensão do homem como ser situado. Devo procurar caracterizar as formas desta compreensão, as várias relações entre seus componentes, e daí tentar compreender a situação humana.
2 - O homem, como ele se conhece, um ser que se encontra no mundo. Mas este mundo já tem formas, certas leis, certo ser próprio. Este homem também já tem em si mesmo uma certa forma de ser: tem dois braços, duas pernas, um corpo enfim que se desenvolve e vai assumindo novas proporções enteriores à sua vontade. É assim que o homem, como ser ativo, é essencialmente um ser que responde. Não é ele que se propõe os seus próprios problemas, estes seriam realmente um choque entre a sua compreensão do mundo e a realidade deste. Assim, o homem não cria, transforma, toda a sua ação consistiria numa interrelação entre ele e o mundo que o cerca. Ora, este mundo que o cerca é constituido por diferentes modalidades de ser que o reptam: pedras de que tem que se desviar, chuva que o molha, automóvel que o conduz, pessoas que agem de diversas formas para com ele, uma sociedade inteira que lhe imprime um dever ser, uma moral. É ainda um determinado ser que reage a este mundo de uma forma específica. E, por fim, reage num determinado momento específico em que só ele poderia reagir e em que só ele está colocado, um momento histórico. É assim que podemos perceber as várias dimensões da situação humana: a física, a biológica, a psicológica, a social e a histórica. Há mais uma que não será desenvolvida neste artigo: a ética.
3 - Até agora pudemos compreender que o homem se situa em determinadas dimensões. Mas é preciso compreender como se situa. Isto é, precisamos caracterizar mais detalhadamente as várias dimensões da situação humana.
4 - Antes de minha existência existia um mundo físico somente no qual eu me conheço e me concebo. Posso não ter consciência das leis que regem este mundo mas isto não me isola do contacto com ele. Se conheço porém as leis que o regem, ou melhor, determinadas leis que o regem, posso transformá-lo mantendo, assim, com ele uma interrelação. Posso tomar várias atitudes diante dele: científica, tentar conhecê-lo, ou mística, tentar explicá-lo, ou poética, sentí-lo, etc. Mas o que realmente importa para o nosso ponto de vista é que estamos situados nele, que não posso deixar de estar nele, pelo menos como eu me conheço. É preciso logo destacar que pelo fato de distinguirmos racionalmente esta dimensão das outras, isto não quer dizer que de fato ela esteja isolada das outras, ao contrário, está intimamente ligada a elas: se eu não tivesse uma constituição vital, biológica, eu não perceberia a sua existência a ela perderia o significado para mim, isto é, não me importaria. Ao mesmo tempo, necessito de um processo sentimental, intelectual, psicológico, e também preciso que isto seja feito num determinado instante que mudará substancialmente o tipo de relação que possa ter com esta dimensão: se vivesse no século 1 não disporia desta luz elétrica que me ilumina o que alteraria fundamentalmente meus conhecimentos, ou mesmo, conceberia este mundo de uma forma inteiramente diferente.
5 - Vejo-me no mundo da maneira como sou. Isto é nasço após um período de gestação e não percebo durante determinado tempo o que passa em torno de mim. Sou criado, sou alimentado, durmo, cresço sou branco ou preto ou mulato, etc., meu corpo tem certas exigências que precisam ser satisfeitas e cuja boa ou má satisfação tem consequência me todo o meu organismo. Tenho um organismo a ser satisfeito. Nesta minha situação biológica é preciso distinguir que há uma parte de mim independente de minha vontade e outra é forjada por mim mesmo, o que aliás acontece com todas as dimensões. Depois veremos a consequência desta liberdade, claro que condicionada pela minha situação. Deve-se nos estar também as inter-relações desta série de fenômenos (que possuem uma característica própria de biológica que as distingue (racionalmente) das outras dimensões da situação humana) com os outros. Quando sou educado, e sou de uma forma que independente de mim, sou criado numa sociedade. Sozinho não poderia responder ao répto biológico, em muitos sentidos ele se encontra respondido pelo grupo onde se formaram meus pais e eu me formo, o biológico e o social se inter-relacionam pois. Assim também acontece com a dimensão psicológica: as minhas formas de reagir me são determinadas por esta sociedadee vão influindo na formação de meu ser biológico. A própria situação física é alterada pela minha presença e é através de meus órgãos que percebo o mundo físico. Assim também a dimensão histórica tem sua forma específica de responder aos fenômenos biológicos e o meu ser biológico livre é condicionado pelo momento histórico em que estou situado. Mas estas interrelações serão mostradas na medida em que fomos caracterizando as várias dimensões.
6 - Ora, se sou um ser de determinadas características biológicas das quais não posso fugir e só posso responder, isto não “importaria” (1) se não percebesse, através de um determinado mecanismo, esta situação. Percebo, memorizo, aprendo, emociono-me, imagino, penso, hajo por motivações de várias espécies tenho uma parte inconsciente de meu ser pela qual estou situado, etc. Isto é, há uma série de fenômenos de características próprias aos quais respondo necessariamente e pelos quais a minha situação está condicionada. Ora, não posso deixar de fazer nenhuma destas coisas e elas constituem, queria ou não, partes do meu ser. É uma dimensão de minha situação à qual tenho que responder necessariamente. Esta resposta pode ser inconsciente ou consciente de qualquer forma ela existirá. Mas as minhas formas de perceber estão relacionadas com a minha situação social e histórica que, como já vimos, influem na situação biológica. A minha situação física altera também minha situação psicológica na medida em que só percebo, a realidade física que percebo, isto é, em que estou situado. Embora não esteja indo como seria desejável para maior clareza, ao exemplo e esteja mais na abstração isto tem um motivo: é que certos exemplos poderiam prejudicar a autenticidade quando lhe faltassem certo rigor científico. O fato de não poder afirmar com grande segurança científica, por falta de uma maior cultura, certos fenômenos psicológicos poderiam levar-me a dar um exemplo falso. Como o que importaria aqui não é exatamente em fato específico de percepção de uma determinada situação mas O FATO de que HÁ esta percepção, deve evitar exemplificações que possam prejudicar a autenticidade da afirmativa. Pois todo o meu trabalho se fundamenta numa elaboração interior e numa visão do mundo que parte de minha experiência pessoal. Quando dispuzer, porém, de maior conhecimento do assunto, exemplificarei para maior clareza.
7 - Há porém uma nova dimensão da situação humana que ainda não foi devidamente tratada. Esta dimensão tem consequência não só no mundo exterior que percebo mas na minha própria percepção. É que pertenço a um determinado agrupamento humano com o qual me relaciono constantemente e dentro de cujo esquema de pensar, concepção de vida etc., penso e me emociono. Assim, há uma série de fenômenos sociais dentro dos quais vivo, sou educado, pertenço ou não a uma classe social, tenho ou não a moral de um grupo, sofro ou não sanções desta sociedade e assim por diante. É uma situação na qual me encontro e à qual tenho que responder, e a minha resposta já está em grande parte elaborada por esta mesma sociedade, ela me ensina como reagir diante dela. Pode-se também perceber mais uma vez as interligações entre as várias dimensões da situação humana quando notamos que nossa forma social de ver o mundo altera fundamentalmente os nossos sentimentos, e toda a nossa psicologia (2). Conforme a sociedade em que vivo tenho tais ou tais hábitos biológicos, como se já não bastasse pertencer a uma determinada raça e não a outra. Conforme a sociedade em que vivo estou mais ou menos abrigado dos fenômenos físicos: se fosse um índio ou um proletário, estaria exposto a chuva e não teria as defesas que tenho na minha posição social e na sociedade em que estou. Assim, percebemos que a alteração em qualquer das nossas dimensões tem consequência em todas as outras, que elas são, portanto, meras divisões racionais, que não se deixam reduzir a estes esquemas.
8 - Mas isto tudo se dá em um determindado momento do tempo físico que, assim carregado de subjetividade, transforma-se em tempo histórico. Pois dentro do tempo físico subsistem as outras dimensões da situação humana e ele se enche de um conteúdo humano. A terra tem milhões de anos, mas, para o homem, somente alguns 5.000 tem conteúdo histórico, tem um significado humano, e isto para alguns homens, e poderá não ter mais para outros homens que, por exemplo, percam a documentação sobre esta época. Esse tempo altera fundamentalmente as outras dimensões e é alterado por elas. Para exemplificar, tomemos um fato qualquer: eu estar escrevendo este artigo. É porque o escrevo agora que posso me utilizar desta caneta esferográfica que só existe de alguns anos para cá, neste tipo de papel com tratamento próprio do século XX, escrevo numa língua própria desta época, idéias próprias de minha idade (fenômeno biológico) e de minha sociedade e época.
9 - Espero ter assim caracterizado razoavelmente, o suficiente para as minhas pretensões, as várias dimensões da situação humana. Vimos assim o homem dentro de uma realidade que o envolve e que ao mesmo tempo ele transforma da maneira como ele é envolvido. E é como este homem “situado” de uma determinada maneira em certas dimensões específicas, que devemos nos ver se nos quisermos compreender. Talvez, com o tempo, possamos vir a conceber uma Antropologia que partiria do estudo das dimensões da situação humana e sua compreensão, e das relações delas entre si e com o homem, para chegarmos a conhecer o homem como ser situado. Tal ciência seria uma síntese do conhecimento moderno do ponto de vista do homem e onde chegaria é impossível calcular.
(1) Quando algo nos IMPORTA, fá-lo de uma determinada maneira. Por exemplo, quando digo que o que importa AO homem é ele mesmo, digo-o na medida em que ele só conhece através de si. Ora, se só pode conhecer através de si, tudo só IMPORTARÁ para ele na sua medida. Isto não significa que Deus, ou o mundo, ou qualquer outra coisa não importa a ele. Nada para o homem pode deixar de ter uma medida humana, e se algo que ele concebe parece-lhe inumano o é na medida do humano, isto é, mais ou menos humano. Para um outro ser o homem importaria na medida deste outro ser.
(2) Todas as dimensões tem esta característica interessante de, ao mesmo tempo em que existem num mundo exterior, já pronto alterarem a nossa percepção deste mundo. Assim, no mundo físico que nos (e portanto exterior a nós) certas formas próprias deste mundo (o clima, considerado no seu todo, a topografia, a alimentação, etc.) alteram profundamente a nossa percepção. Assim também, certos tipos de regiões nos fazem ter certas formas específicas de pensar, etc. Ora, estas formas de pensar ou estas na nossa percepção nos levam a vê-lo, este próprio mundo, de uma maneira específica. Aí pode-se notar bem estas duas faces das dimensões situacionais: a exterior e a interior.
2 - O homem, como ele se conhece, um ser que se encontra no mundo. Mas este mundo já tem formas, certas leis, certo ser próprio. Este homem também já tem em si mesmo uma certa forma de ser: tem dois braços, duas pernas, um corpo enfim que se desenvolve e vai assumindo novas proporções enteriores à sua vontade. É assim que o homem, como ser ativo, é essencialmente um ser que responde. Não é ele que se propõe os seus próprios problemas, estes seriam realmente um choque entre a sua compreensão do mundo e a realidade deste. Assim, o homem não cria, transforma, toda a sua ação consistiria numa interrelação entre ele e o mundo que o cerca. Ora, este mundo que o cerca é constituido por diferentes modalidades de ser que o reptam: pedras de que tem que se desviar, chuva que o molha, automóvel que o conduz, pessoas que agem de diversas formas para com ele, uma sociedade inteira que lhe imprime um dever ser, uma moral. É ainda um determinado ser que reage a este mundo de uma forma específica. E, por fim, reage num determinado momento específico em que só ele poderia reagir e em que só ele está colocado, um momento histórico. É assim que podemos perceber as várias dimensões da situação humana: a física, a biológica, a psicológica, a social e a histórica. Há mais uma que não será desenvolvida neste artigo: a ética.
3 - Até agora pudemos compreender que o homem se situa em determinadas dimensões. Mas é preciso compreender como se situa. Isto é, precisamos caracterizar mais detalhadamente as várias dimensões da situação humana.
4 - Antes de minha existência existia um mundo físico somente no qual eu me conheço e me concebo. Posso não ter consciência das leis que regem este mundo mas isto não me isola do contacto com ele. Se conheço porém as leis que o regem, ou melhor, determinadas leis que o regem, posso transformá-lo mantendo, assim, com ele uma interrelação. Posso tomar várias atitudes diante dele: científica, tentar conhecê-lo, ou mística, tentar explicá-lo, ou poética, sentí-lo, etc. Mas o que realmente importa para o nosso ponto de vista é que estamos situados nele, que não posso deixar de estar nele, pelo menos como eu me conheço. É preciso logo destacar que pelo fato de distinguirmos racionalmente esta dimensão das outras, isto não quer dizer que de fato ela esteja isolada das outras, ao contrário, está intimamente ligada a elas: se eu não tivesse uma constituição vital, biológica, eu não perceberia a sua existência a ela perderia o significado para mim, isto é, não me importaria. Ao mesmo tempo, necessito de um processo sentimental, intelectual, psicológico, e também preciso que isto seja feito num determinado instante que mudará substancialmente o tipo de relação que possa ter com esta dimensão: se vivesse no século 1 não disporia desta luz elétrica que me ilumina o que alteraria fundamentalmente meus conhecimentos, ou mesmo, conceberia este mundo de uma forma inteiramente diferente.
5 - Vejo-me no mundo da maneira como sou. Isto é nasço após um período de gestação e não percebo durante determinado tempo o que passa em torno de mim. Sou criado, sou alimentado, durmo, cresço sou branco ou preto ou mulato, etc., meu corpo tem certas exigências que precisam ser satisfeitas e cuja boa ou má satisfação tem consequência me todo o meu organismo. Tenho um organismo a ser satisfeito. Nesta minha situação biológica é preciso distinguir que há uma parte de mim independente de minha vontade e outra é forjada por mim mesmo, o que aliás acontece com todas as dimensões. Depois veremos a consequência desta liberdade, claro que condicionada pela minha situação. Deve-se nos estar também as inter-relações desta série de fenômenos (que possuem uma característica própria de biológica que as distingue (racionalmente) das outras dimensões da situação humana) com os outros. Quando sou educado, e sou de uma forma que independente de mim, sou criado numa sociedade. Sozinho não poderia responder ao répto biológico, em muitos sentidos ele se encontra respondido pelo grupo onde se formaram meus pais e eu me formo, o biológico e o social se inter-relacionam pois. Assim também acontece com a dimensão psicológica: as minhas formas de reagir me são determinadas por esta sociedadee vão influindo na formação de meu ser biológico. A própria situação física é alterada pela minha presença e é através de meus órgãos que percebo o mundo físico. Assim também a dimensão histórica tem sua forma específica de responder aos fenômenos biológicos e o meu ser biológico livre é condicionado pelo momento histórico em que estou situado. Mas estas interrelações serão mostradas na medida em que fomos caracterizando as várias dimensões.
6 - Ora, se sou um ser de determinadas características biológicas das quais não posso fugir e só posso responder, isto não “importaria” (1) se não percebesse, através de um determinado mecanismo, esta situação. Percebo, memorizo, aprendo, emociono-me, imagino, penso, hajo por motivações de várias espécies tenho uma parte inconsciente de meu ser pela qual estou situado, etc. Isto é, há uma série de fenômenos de características próprias aos quais respondo necessariamente e pelos quais a minha situação está condicionada. Ora, não posso deixar de fazer nenhuma destas coisas e elas constituem, queria ou não, partes do meu ser. É uma dimensão de minha situação à qual tenho que responder necessariamente. Esta resposta pode ser inconsciente ou consciente de qualquer forma ela existirá. Mas as minhas formas de perceber estão relacionadas com a minha situação social e histórica que, como já vimos, influem na situação biológica. A minha situação física altera também minha situação psicológica na medida em que só percebo, a realidade física que percebo, isto é, em que estou situado. Embora não esteja indo como seria desejável para maior clareza, ao exemplo e esteja mais na abstração isto tem um motivo: é que certos exemplos poderiam prejudicar a autenticidade quando lhe faltassem certo rigor científico. O fato de não poder afirmar com grande segurança científica, por falta de uma maior cultura, certos fenômenos psicológicos poderiam levar-me a dar um exemplo falso. Como o que importaria aqui não é exatamente em fato específico de percepção de uma determinada situação mas O FATO de que HÁ esta percepção, deve evitar exemplificações que possam prejudicar a autenticidade da afirmativa. Pois todo o meu trabalho se fundamenta numa elaboração interior e numa visão do mundo que parte de minha experiência pessoal. Quando dispuzer, porém, de maior conhecimento do assunto, exemplificarei para maior clareza.
7 - Há porém uma nova dimensão da situação humana que ainda não foi devidamente tratada. Esta dimensão tem consequência não só no mundo exterior que percebo mas na minha própria percepção. É que pertenço a um determinado agrupamento humano com o qual me relaciono constantemente e dentro de cujo esquema de pensar, concepção de vida etc., penso e me emociono. Assim, há uma série de fenômenos sociais dentro dos quais vivo, sou educado, pertenço ou não a uma classe social, tenho ou não a moral de um grupo, sofro ou não sanções desta sociedade e assim por diante. É uma situação na qual me encontro e à qual tenho que responder, e a minha resposta já está em grande parte elaborada por esta mesma sociedade, ela me ensina como reagir diante dela. Pode-se também perceber mais uma vez as interligações entre as várias dimensões da situação humana quando notamos que nossa forma social de ver o mundo altera fundamentalmente os nossos sentimentos, e toda a nossa psicologia (2). Conforme a sociedade em que vivo tenho tais ou tais hábitos biológicos, como se já não bastasse pertencer a uma determinada raça e não a outra. Conforme a sociedade em que vivo estou mais ou menos abrigado dos fenômenos físicos: se fosse um índio ou um proletário, estaria exposto a chuva e não teria as defesas que tenho na minha posição social e na sociedade em que estou. Assim, percebemos que a alteração em qualquer das nossas dimensões tem consequência em todas as outras, que elas são, portanto, meras divisões racionais, que não se deixam reduzir a estes esquemas.
8 - Mas isto tudo se dá em um determindado momento do tempo físico que, assim carregado de subjetividade, transforma-se em tempo histórico. Pois dentro do tempo físico subsistem as outras dimensões da situação humana e ele se enche de um conteúdo humano. A terra tem milhões de anos, mas, para o homem, somente alguns 5.000 tem conteúdo histórico, tem um significado humano, e isto para alguns homens, e poderá não ter mais para outros homens que, por exemplo, percam a documentação sobre esta época. Esse tempo altera fundamentalmente as outras dimensões e é alterado por elas. Para exemplificar, tomemos um fato qualquer: eu estar escrevendo este artigo. É porque o escrevo agora que posso me utilizar desta caneta esferográfica que só existe de alguns anos para cá, neste tipo de papel com tratamento próprio do século XX, escrevo numa língua própria desta época, idéias próprias de minha idade (fenômeno biológico) e de minha sociedade e época.
9 - Espero ter assim caracterizado razoavelmente, o suficiente para as minhas pretensões, as várias dimensões da situação humana. Vimos assim o homem dentro de uma realidade que o envolve e que ao mesmo tempo ele transforma da maneira como ele é envolvido. E é como este homem “situado” de uma determinada maneira em certas dimensões específicas, que devemos nos ver se nos quisermos compreender. Talvez, com o tempo, possamos vir a conceber uma Antropologia que partiria do estudo das dimensões da situação humana e sua compreensão, e das relações delas entre si e com o homem, para chegarmos a conhecer o homem como ser situado. Tal ciência seria uma síntese do conhecimento moderno do ponto de vista do homem e onde chegaria é impossível calcular.
(1) Quando algo nos IMPORTA, fá-lo de uma determinada maneira. Por exemplo, quando digo que o que importa AO homem é ele mesmo, digo-o na medida em que ele só conhece através de si. Ora, se só pode conhecer através de si, tudo só IMPORTARÁ para ele na sua medida. Isto não significa que Deus, ou o mundo, ou qualquer outra coisa não importa a ele. Nada para o homem pode deixar de ter uma medida humana, e se algo que ele concebe parece-lhe inumano o é na medida do humano, isto é, mais ou menos humano. Para um outro ser o homem importaria na medida deste outro ser.
(2) Todas as dimensões tem esta característica interessante de, ao mesmo tempo em que existem num mundo exterior, já pronto alterarem a nossa percepção deste mundo. Assim, no mundo físico que nos
Um Repórter nas Letras e nas Artes - Affonso Romana de Sant’anna
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