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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

O debate sobre a carta aberta a Fernando Henrique Cardoso

Tenho recebido várias manifestações de apoio à Carta Aberta a Fernando Henrique mas também algumas críticas sérias, como as que me pede um esclarecimento um leitor que se coloca do meu lado sem ter os meios de respondê-las. Creio que vale a pena divulgar esta reposta pelo interesse que tem provocado a minha carta.



Estimado Valmir



Eu não disse que o plano real não derrubou a inflação e sim que se situou dentro de uma tendência deflacionária da economia mundial. TODOS os paises terminaram com a inflação neste período e não fizeram um plano real. Contudo, ao manter a moeda sobre valorizada e ao não tomar medidas estruturais contra a inflação e sobretudo ao elevar absurdamente os juros, a equipe econômica manteve a nossa inflação entre as mais altas do mundo. Não se trata de comparar a inflação do período Fernando Henrique com a fase que, em entrevista para os 40 anos do CEBRAP, Serra chamou de “superinflação” para distinguir de uma tendência ao crescimento infinito da inflação que seria considerada uma ”hiperinflação”. Trata-se de comparar a inflação do período FHC com a inflação de todos os outros paises. E a nossa inflação foi mais de 5 vezes mais alta que os casos mais bem sucedidos. Dizer que isto é sectarismo ou má analise econômica é demonstrar um delírio teórico insensato. Que teoria econômica pode considerar uma baixa inflação uma alta de preços 5 vezes maior que a do resto da economia mundial? É elementar exceto para quem está com a mente obliterada por uma propaganda absurda.



No que se refere às taxas de não crescimento no período Fernando Henrique não é correto colocar acima do Brasil os poucos paises citados. Existe uma ampla literatura científica comparando as taxas de crescimento do Brasil e de outros paises latino americanos sobretudo com as taxas de crescimento asiáticas. Os autores da crítica poderiam citar pelo menos os casos da China e da Índia. No governo Fernando Henrique se abandonou totalmente qualquer política industrial e se praticou uma política de juros tresloucada e um endividamento colossal. Ou os críticos vão negar também que o aumento da dívida pública no período foi simplesmente irresponsável? Em torno de 15 vezes!!!



É verdade que durante o governo Lula houve uma tendência internacional mais favorável no mercado mundial de matérias primas, explicada em grande parte pela explosão da demanda chinesa. Mas é claro que a política externa independente do governo Lula, aliada a uma política industrial no BNDES permitiram aproveitar a conjuntura e formar reservas tão impressionantes (seguindo uma tendência geral no mesmo sentido entre as economias emergentes). É verdade que a política macro econômica do Banco Central, que manteve em parte a política macro econômica equivocada do período anterior (pois finalmente houve uma queda da taxa de juros, insuficiente mas importante) impediu um crescimento maior do nosso comércio exterior e do nosso crescimento econômico. O compromisso do governo Lula com esta situação tem uma explicação política e não econômica. É notório o poder que exerce sobre os meios de comunicação este setor financeiro. Muitos consideram que não seria possível confrontar com o poder desta minoria à qual pertencem hoje em dia muitos dos quadros do governo Fernando Henrique. 



A verdade é que o governo Lula encontrou vários mecanismos para ampliar a demanda (melhor distribuição de renda e mais crédito) e garantir o crescimento econômico, inclusive numa fase de crise muito superior a todas que viveu o governo Fernando Henrique. O povo brasileiro soube reconhecer a competência do governo Lula que deve muito a Dilma. O PAC foi um destes instrumentos que se mostrou muito efetivo, assim como a amplitude do programa bolsa família, o apoio à economia solidária e outras políticas menos badaladas. 



Porque Dilma não atraiu os votos de todos os que consideram bom ou ótimo o governo Lula? Porque se aproveitou o pouco conhecimento da mesma pelo grande público, através de uma campanha de calúnias impressionante e porque Serra, blindado por uma imprensa a seu serviço, conseguiu transmitir a idéia de que dará continuidade ao governo Lula, obscurecendo suas alianças estruturais com a direita e suas declarações direitistas de política exterior e de seu compromisso com forças reacionárias internamente. Não há dúvida de que o próprio PSDB e até o DEM buscaram desligar-se ao máximo do governo Fernando Henrique, pois apesar de todos os mitos que se mantiveram sobre este governo, o nosso povo o rejeita definitivamente. 



Gostaria que os críticos lessem meus trabalhos nos quais se analisa muito mais em detalhe todas estas e outras questões paralelas e que não conseguiram ser publicados senão muito ocasionalmente na chamada grande imprensa do Brasil. Se tiverem interesse os remeto não somente ao meu blog mas também ao website da reggen ( www.reggen.org.br) ou ao site do Monitor Mercantil a cujo conselho editorial pertenço. Se podem ler espanhol, eu os remeto à publicação virtual do meu livro também esgotado em sua edição em espanhol: Do Terror à Esperança: Auge e Decadência do Neoliberalismo (Editorial Monte Ávila, Caracas. Pode-se baixar gratuitamente) ou à edição brasileira (Idéias & Letras, Aparecida, São Paulo)..

É bom esclarecer aos leitores que não conhecem minha obra que publiquei 43 livros e centenas de artigos em 20 línguas e mais de 40 paises, só uma parte deles no Brasil, estando quase todos esgotados..


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Prezado Theotonio,

Gostei MUITO da sua Carta aberta a Fernando Henrique Cardoso. Ajudou muito na compreensão do que foi realmente o Plano Real.

Entretanto não tenho fluência suficiente para responder a um comentário feito em um dos grupos de discussão na Internet que participo. Se não for abusar muito, gostaria que você o comentasse.

obrigado,

Valmir Miranda



"Puxa, O Plano Real não foi o responsável pela derrubada da inflação ? 

Hiperinflação mundial ? Eu lembro, era 230% na Holanda, 317% no Canadá, 86% na Inglaterra, 477% no Chile e 118% na França.

Aí, por razões conjunturais mundiais, todas caíram abaixo de 10%, como em uma epidemia. Devo ser o Eremildo (personagem do golpista Elio Gaspari).



Já que estamos falando de conjuntura mundial x mitos, analisei dados do Banco Mundial, sobre PIB per capita, período FHC x Lula.

Os países que cresceram mais no período FHC do que no período Lula foram:

Guiné Equatorial, Honduras, Jamaica, Bósnia, Zimbabwe, Belize, Granada e Liberia.



Todos os outros países do mundo tiveram crescimento maior no período Lula do que no período FHC; muitos deles com diferença bem maior que a brasileira, que é expressiva.

10 comentários:

  1. Theotonio, desculpe-me, mas você disse sim! Em sua carta consta a seguinte frase:

    "Em primeiro lugar vamos desmitificar a afirmação de que foi o plano real que acabou com a inflação"

    O que isso quer dizer então???

    Discordo de mais uma série de colocações em sua carta, mas destaco a seguinte: se a provável eleição do Lula não era um fator de inquietação no mercado em que o Real se desvalorizou, porque o Lula teve que escrever a carta aos brasileiros, desdizendo tudo que sempre disse???

    Att, Wagner

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  2. Theotonio, desculpe-me, mas você disse sim! Em sua carta consta a seguinte frase:

    "Em primeiro lugar vamos desmitificar a afirmação de que foi o plano real que acabou com a inflação"

    O que isso quer dizer então???

    Discordo de mais uma série de colocações em sua carta, mas destaco a seguinte: se a provável eleição do Lula não era um fator de inquietação no mercado em que o Real se desvalorizou, porque o Lula teve que escrever a carta aos brasileiros, desdizendo tudo que sempre disse???

    Att, Wagner

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  3. Theotonio, desculpe-me, mas você disse sim! Em sua carta consta a seguinte frase:

    "Em primeiro lugar vamos desmitificar a afirmação de que foi o plano real que acabou com a inflação"

    O que isso quer dizer então???

    Discordo de mais uma série de colocações em sua carta, mas destaco a seguinte: se a provável eleição do Lula não era um fator de inquietação no mercado em que o Real se desvalorizou, porque o Lula teve que escrever a carta aos brasileiros, desdizendo tudo que sempre disse???

    Att, Wagner

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  4. As alegações econômicas do que não é bem uma carta, mas um panfleto mal costurado e sectário, são todas falsas, e surpreende que um acadêmico seja capaz de trazer dados falsos a seus leitores e alunos.
    Desmantelei os dados falsos em dois posts de meu blog, acessaveis neste link:
    http://diplomatizzando.blogspot.com/2010/10/continuando-mentir-e-manipular-os-dados.html
    As alegações políticas ficam por conta do sectarismo de alguém que não consegue conviver com a alternância democrática e precisa consolidar o domínio de um grupo autoritário sobre o poder político.
    Trata-se de um retrocesso inaceitável para um país como o Brasil.
    Paulo R. de Almeida
    www.pralmeida.org

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  5. Caro Professor,

    Seu dados sobre inflacao estao errados.
    Ver:
    http://lmonasterio.blogspot.com/2010/10/estranha-cartinha-do-theotonio-dos.html

    Att,
    LMM

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  6. Caro Theotonio,
    Primeiro, gostaria de parabeniza-lo pela carta e por esse debate.
    Em seguida, gostaria de lhe fazer algumas perguntas, que podem de fato carecer de uma verdadeira pesquisa anterior, como também podem ser fruto de minha ignorância. Em todo caso são questões que me vieram de primeira, e sao feitas no frescor da dúvida.
    São elas:
    1- Se nao me engano, boa parte dos anos 90, EUA e Japao por exemplo, viviam deflações, não hiperinflação. E, honestamente, não me parece q um "movimento mundial" apenas faria nossa inflação cair de uns 2000% ao ano para 10%... e, se assim foi, o que aconteceu no mundo para, em 12 meses a inflação cair 200 vezes?
    2- A inflação alta já não era um problema "gravíssimo" desde o Janio Quadros, nos anos 60... então, desde os anos 60 o mundo viva com alta inflação?
    3- A carta diz que o FHC entregoou o país com 850 bilões de dólares em dívidas,.. mas isso era praticamente todo o nosso PIB em 2002?
    4- A carta também se refere aos 100 bilhões de dólares obtidos com as privatizações. Mas o valor não ficou na casa dos 60 bilhões?

    Sem mais, e esperando possíveis resposta,
    Desde já agradeço.
    Abraço,
    Fábio

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  7. Por favor, leia.

    http://ecen.com/eee41/eee41p/inflacao.htm

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Plano_Real

    http://www.ppge.ufrgs.br/anpecsul2005/artigos/area5-01.pdf


    Dizer que o Plano Real foi simplesmente nulo, é como dizer que a Diretas Já foi nula para a democracia, visto que todo o cenário político mundial apontava queda das ditaduras.

    E cite fontes. O artigo falha em dizer, por exemplo, quais foram os benefícios do PAC. Se conhecem inúmeras falhas e várias das obras do PAC ainda não terminadas (como será que essas obras ajudaram no desenvolvimento do Brasil nos últimos 8 anos?).

    Poderia citar aqui também o famigerado Fome Zero... mas vamos começar do começo.

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  8. Prezado professor,
    achei bem interessante sua carta, pois é um contra ponto à carta de FHC.
    Sobre seus comentários, 2 dúvidas.
    A primeira é sobre a dívida pública, que aumentou muito no governo Lula, http://notapajos.globo.com/lernoticias.asp?id=33296&tt=Governo%20Lula%20deixar%C3%A1%20a%20maior%20div%C3%ADda%20p%C3%BAblica%20dos%20%C3%BAltimos%20anos
    A outra é sobre o PAC, em artigo que li semana passada, é relatado que foi muito mais propaganda. No Paraná cumpriu menos de 2% do prometido.
    De resto,um comentário, sempre devemos analisar as coisas, no caso governo, pela conjuntura em que se encontravam. Pode ter sido, como escreveu, uma situação inernacional, mas FHC tem o mérito do Plano Real. Tenho dúvida se Lula, com o PT, faria o mesmo, pois teria a tendência de aparelhar o estado primeiro.

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  9. Afirmar que "Os dados mostram que até 1993 a economia mundial vivia uma hiperinflação na qual todas as economias apresentavam inflações superiores a 10%" é falso porque os dados não mostram todos os países com inflação acima de 10% (http://www.cei.gov.ar/estadisticas/internac/cuadro10.xls) e ainda mostra um claro desconhecimento do conceito de hiperinflação, do qual o movimento inflacionário simplemente destroi toda relação de preços relativos. Estariamos na mesma situação da hiperinflação alemã? Também acho incorreto falar em inflação mundial, por onde era transmitido essa suposta generalização mundial? Por uma expansão mundial do Banco central da terra??? E qual foi o tal fator que diminui essa inflação em escala global. Fala que isso ocorreu, com dados claramente incorretos e ainda não explicar como a inflação caiu é de uma falta de clareza intelectual sem tamanho.
    Triste ver opiniões tão viesadas em nome do momento eleitoral. E olha que eu vou votar na dilma.

    Att
    Diego

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  10. Gostaria de saber o link em que posso acessar o livro "Do Terror à Esperança: Auge e Decadência do Neoliberalismo" (Editorial Monte Ávila, Caracas. ou à edição brasileira (Idéias & Letras, Aparecida, São Paulo).. Prefiro a edição brasileira, mas não sendo possível já me atende a edição em Espanhol.

    Abs

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